Orçamento Participativo

Orçamento participativo: na prática, não é nada daquilo que se previa


Carla Rodrigues
Especial para o Jornal de Brasília
Mais uma reunião para definir ilusões. O Governo do Distrito Federal (GDF) está chamando a população para discutir as prioridades do Projeto de Lei Orçamentária (PLOA) de 2014, em audiência pública que acontece hoje. Porém, na contramão do convite, não foi feito quase nada das 31 obras previstas no Orçamento Participativo (OPDF) de 2012. Segundo representantes das comunidades do DF, a medida, que previa a participação direta dos cidadãos na escolha de investimentos e despesas da verba pública, não passa de uma mentira. 

Há mais de dois anos, 76 conselheiros foram empossados pelo governador Agnelo Queiroz para integrar  as plenárias de debates sobre o andamento propostas. Contudo, cansados das promessas do governo, a maioria já abandonou os cargos. “O pessoal foi se desestimulando. Nada das obras que foram priorizadas no orçamento anterior e no deste ano saiu”, denuncia o conselheiro do Sudoeste, Elder Rocha.
  
Mesmo ali, em um setor bem próximo do Plano Piloto, os projetos não andaram. “Havia a expectativa de que se iniciasse a construção do posto de saúde, mas não temos notícias disso. A Secretaria de Saúde, por exemplo, diz que não tem área destinada ao posto, mas isso é mentira. Tem sim. Entre as QRSWs  2 e  3”, argumenta o conselheiro do Sudoeste.

As eleitas

Na época em que foram eleitas as prioridades especiais do Orçamento Participativo, em 2012, a construção do Hospital Regional de São Sebastião ficou em primeiro lugar, com mais de 3,5 mil votos da população. A equipe de reportagem do Jornal de Brasília foi até o local destinado à obra e não encontrou nada além de um extenso terreno sem utilização alguma. Aliás, segundo relatos de moradores próximos ao local, a área serve apenas para “juntar ratos”. 

Enquanto isso, a população de São Sebastião conta apenas com a Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) para emergências. Desiludidos com a ideia de ter um hospital regional, alguns disseram que “têm a notícia de que existe o projeto na administração, mas ninguém acredita mais”. A opinião é da gerente de uma mecânica  Darcley da Silva, 24 anos. 

“A saúde daqui é um terror. Sem opção, vamos ao Paranoá, que está sempre lotado. A UPA daqui nunca tem médicos. É um descaso total. Precisamos urgentemente de um hospital, mas já perdemos a esperança mesmo”, lamenta a trabalhadora.
  
A falta que um hospital público faz
  
Clauberth Oliveira, 20 anos, trabalha em  São Sebastião e precisou de atendimento emergencial há mais ou menos uma semana. De acordo com ele, seus dentes latejavam e a dor era quase insuportável.

 “Fiquei cinco horas esperando na UPA. Aí, ficaram dando prioridades a outros casos e eu desisti. Nessa hora, percebi o quanto faz falta pra gente ter um hospital aqui. Deveria ser uma prioridade mesmo, mas não é”, salientou. Enquanto isso, Clauberth destacou, “o terreno destinado à obra continua aqui, só com mato e sem utilidade alguma”.

Procurado pela reportagem do Jornal de Brasília, o administrador regional de São Sebastião, Antônio Moreno, não recebeu a equipe em seu gabinete. 

Sem respostas

Em 2012, quando começou a movimentação para o andamento do Orçamento Participativo, coordenado pela Secretaria de Governo, a verba destinada às obras era de R$ 1,2 bilhão. Quanto já foi aplicado? Ninguém responde. Procurada pela reportagem, a assessoria do GDF não disse quais são as obras em andamento, os valores   nem os prazos. 

Além disso, também não informou quantas são as obras previstas para este ano e quais eram as do ano passado. Nada foi respondido ao JBr, mesmo sabendo que a informação é de interesse público. Na época da divulgação do Orçamento Participativo, o governador Agnelo Queiroz garantiu: “As propostas populares que foram aprovadas serão executadas neste ano com prioridade”. 


À espera de uma escola




Outra prioridade eleita pela população, com 2,7 mil votos, era a construção da Escola de Ensino Fundamental da Quadra 501 do Trecho 1 do Sol Nascente. Mais uma vez, a reportagem foi atrás da obra. Novamente, não encontrou nada mais do que um terreno baldio e uma população carente de investimentos. 


“Desde que nos mudamos para cá existe a promessa de que vai sair uma escola por aqui. Mas  nunca vimos nenhuma ação”, apontou o marceneiro Francisco Leão, 36 anos. Ele e a mulher atravessam a cidade para deixar as filhas no colégio mais próximo, em Ceilândia Norte.


“Levamos e buscamos. A estrada é perigosa, não tem segurança nenhuma. A sensação é de abandono mesmo”, destacou ainda Emanuela Silva, 34 anos,  mãe de Renata, 4; e Stefany, 12. A vizinha do casal, mãe de quatro crianças, Fernanda Rodrigues, 26, disse ainda que “as poucas promessas do governo nunca são cumpridas, por isso nem existe mais a expectativa de que a escola seja construída”. 


Grávida, outra moradora da área, July Evelyn Marques, 18 anos, brincou com a situação: “Quem sabe meu filho, quando estiver no Ensino Médio, consiga usufruir da escola”. Elas contaram ainda que havia a “notícia” de que a região teria uma UPA, um posto policial e asfalto. Nada saiu até agora. “Aqui não tem nada. Ontem mesmo um levou tiro por aqui. É terra de ninguém”, denunciaram. 


Itapoã


Integrante da coordenação da Central de Movimentos Populares do DF, Marcelo Geavano, também conselheiro eleito pelo Itapoã, garantiu ao JBr que “das prioridades da região, de 2011 até hoje, nenhuma foi executada”. Para ele, a própria dinâmica da política fere o conceito de Orçamento Participativo, já que os parlamentares e governos eleitos gostam, em sua maioria, de gabar-se dos projetos em execução como uma obra sua. “Para discurso político, talvez a iniciativa não seja muito vantajosa”, destacou.  


Enfim, a reportagem conseguiu localizar uma obra em andamento. Em Samambaia, a terceira prioridade especial eleita pela população, com mais de 2,5 mil votos, a cobertura do ginásio do Centro de Ensino Médio 414,     está no esqueleto.




Fonte: Da redação do clicabrasilia.com.br